7 lições que a crise trouxe

Ainda estão para inventar uma melhor professora do que a crise; ela é implacável, mas cheia de lições, pra quem quiser aprender, é claro.

Em 15 anos de história, a Aliança Empreendedora já passou por umas quantas crises, e todas tinham alguma coisa para ensinar, mas acho que esta foi a primeira vez que experimentamos a pior crise financeira, e ainda, poucos meses antes estourar a pandemia. Sim, mal estávamos tentando nos recuperar do susto e vem a pandemia para virar tudo de ponta cabeça. O resultado? Reinvenção total e completa.

O objetivo deste artigo é compartilhar um pouco do que foi e ainda está sendo o maior aprendizado da nossa história, e quais lições as organizações podem aplicar e a fim de se tornarem mais resilientes e porque não, antifrágeis.

O ano de 2018 finalizou em grande estilo, tínhamos atingido todas nossas metas, tanto de impacto como financeiras, novos parceiros estavam chegando, nosso crescimento tinha sido exponencial e nossa auto confiança estava na estratosfera. Coincidentemente em 2019 terminavam os 3 maiores projetos da nossa carteira, mas nós tínhamos certeza que novos projetos ocupariam o “vazio” que esses três deixariam. O fim do ano foi se aproximando e esse vazio foi ficando cada vez maior e nós não conseguíamos entender porque aquilo estava acontecendo. E então aprendemos que o espaço de tempo entre surfar uma onda “like a boss”, e tomar um caldo que nem um pato, é de segundos. Segundos de distração, segundos de negação, somados ao que eu chamo de arrogância organizacional, uma armadilha na qual todos estamos sujeitos a cair uma hora ou outra. Toda organização tem um ciclo de vida, que precisa ser renovado para que esta não morra, assim como a natureza se renova, as pessoas e as organizações também devem fazê-lo, e só tem duas formas: pelo amor ou pela dor, e por isso as crises são tão importantes na nossa vida, pois elas fazem o trabalho por nós quando a rotina toma conta e os olhos se fecham para o que está emergindo.

A crise, como boa professora, sempre deixa muitas lições, mas precisamente 7 delas quero registrar aqui.

1. Foco no impacto: Quando a poeira baixa, as perguntas emergem, porque estamos fazendo o que fazemos? a quem servimos? onde estamos investindo a maior parte do nosso tempo?. Quando a poeira baixa muita coisa fica escancarada, e coisas que antes eram difíceis de enxergar ficam completamente nítidas. Fica fácil reconhecer que a rotina e as demandas de terceiros acabam tomando mais tempo do que o que investimos diretamente no microempreendedor lá na ponta. Fica visível o tanto de procedimentos e tarefas desnecessárias que executamos sem questionar; e o gap entre o que gostaríamos de estar fazendo e o que realmente fazemos ganha uma nova dimensão e nos dá um tapa na cara. A lição que fica é, não esperemos a crise para revisitar toda nossa atuação, e colocar para rodar aquilo que há tanto tempo sabemos que é necessário fazer. Saia da rotina e se desafie a encontrar melhores maneiras de alcançar o impacto, nunca pare de olhar para o seu beneficiado e se perguntar: o que podemos fazer melhor hoje e amanhã para eles e elas?

2. O valor das parcerias: A Aliança Empreendedora não tem esse nome à toa, é uma organização que foi construída e cresceu graças a uma rede incrível de parceiros, apoiadores, organizações do ecossistema e amigos. E quando a crise bate, é essa rede com a qual se pode contar. Poucos dias após estourar a pandemia, a Aliança convocou seus parceiros para pensar e criar soluções juntos, em prol dos microempreendedores, e fomos surpreendidos com o maior engajamento que já tivemos. Não só estavam mobilizados como também novos parceiros se juntaram às nossas ações. Uma rede de aliados vale mais do que um orçamento milionário, nunca se esqueçam disso.

3. Mais leve e mais ágil: A mudança é dolorida, a crise é implacável, ela arranca pedaços, às vezes, mais do que a gente gostaria. Perder pessoas dói, abrir mão de estruturas dói, abrir mão da sensação de segurança dói, mas essa é a hora certa para desafiar o status quo, chutar o pau da barraca, abrir mão de títulos e estruturas e trazer leveza e agilidade para seguir com o propósito e ser eficiente no impacto. É hora de fazer mais com menos e para isso é preciso achatar, desburocratizar, e se redesenhar.

4. Uma equipe, um tesouro: Este, eu diria, é o ponto mais importante de todos. Uma das coisas que mais me emocionou e me emociona é a nobreza das pessoas. Aquelas, às quais tivemos que dizer adeus por conta da crise financeira, foram super parceiras e nos encheram de palavras de alento e força, confirmando que estavam com a gente independente da situação, e que fariam de tudo para apoiar a Aliança de alguma forma pra sair dessa, e claro, se colocaram à disposição para voltar assim que a gente precisar, e de fato, algumas já voltaram. Aqueles que ficaram, meu Deus, que raça! O tesouro mais precioso de uma organização não é sua inteligência, seus parceiros, e muito menos seu caixa, são as PESSOAS. Na hora que o cinto aperta e as coisas ficam difíceis, é a equipe que vai fazer a “mágica” acontecer, e se não fosse essa equipe incrível de pessoas incríveis, a Aliança não teria sobrevivido. Ganhamos maturidade, colocamos a equipe toda pra decidir e empreender, criamos comitês de crise, e foi dada autonomia para resolver problemas. Temos muito que aprender, e um longo caminho pela frente. mas saber que a organização está nas mãos destas pessoas nos faz acreditar que tudo é possível.

5 Resiliência é um verbo:

“O termo resiliência tem a ver com a capacidade de um material ou corpo de sofrer pressão e recuperar seu estado original” (Thomas Young, 1807)

Não se enganem, a resiliência não é uma dádiva divina, e muito menos uma característica que só algumas organizações tem. Resiliência é quase um ato de rebeldia, de não se conformar com o cenário ruim que está exposto à nossa frente. É trabalhar dia e noite pra sair da crise, mais forte do que chegou. É ativar todos os ativos da organização e colocá-los pra trabalhar com um único fim, sair do outro lado vivo, com alguns arranhões sim, mas vivo e fortalecido. Resiliência é uma atitude que pode ser aprendida, sim, todas as organizações podem ser resilientes, não importa seu tamanho, ou seu orçamento. Junte tudo o que tem de valor na sua organização, as pessoas, os parceiros, as redes, os beneficiados, sua inteligência, e coloque tudo para trabalhar, a crise dá o empurrão, cabe a nós aproveitar a o efeito da inércia e seguir em movimento.

6. Prestando atenção aos sinais: As crises podem ser sorrateiras e até totalmente imprevisíveis (como foi o caso da pandemia pela qual estamos passando), mas a maioria delas dá sinais bem claros, cabe a gente estar antenado. A crise não chega de um dia para o outro, nós é que percebemos tarde demais. No momento em que você tem mais certeza que está surfando a onda, CUIDADO!, é bem provável que ela esteja a ponto de te derrubar. O mercado dá sinais, os parceiros dão sinais, os beneficiados das nossas ações dão sinais, a equipe dá sinais, o governo dá sinais, toda hora, o tempo todo estamos recebendo as mensagens codificadas do que está por vir, mas é só quando estamos prestando atenção, é que podemos decifrá-las. E aqui, a habilidade mais importante de todas é a HUMILDADE. É preciso humildade para admitir que não fazemos tudo certo o tempo todo e que muitas coisas podem melhorar, é preciso humildade até para fazer uma análise de projeções financeiras, e para ouvir o que os outros tem a dizer sobre nosso trabalho. A humildade é o antidoto da arrogância, aquela que turva nossa visão e não nos deixa ver os sinais.

7. Se prepare para a próxima, torne-se antifrágil:

“O antifrágil, oposto de frágil, é algo que melhora quando está diante de uma situação inesperada” (Taleb Nicholas, 2012)

De nada serve passar por todo um processo doloroso de crise, mudanças e adaptações, se na primeira oportunidade que temos voltamos atrás no engessamento, e adotamos as “caixinhas” que tanto conforto nos dão. O principio de uma organização antifrágil é que ela está sempre pronta para o que der e vier, não se esconde da crise, mas a abraça e se fortalece com ela.