Iniciado em 2014, o programa Tecendo Sonhos apoia desde os seus primeiros dias costureiros e donos de oficina de facção, na sua grande maioria imigrantes, em São Paulo através de capacitação empreendedora, acesso ao mercado justo e advocacy, visando o trabalho decente. Até 2019, foram 759 beneficiados que passaram nas mãos das facilitadoras da Aliança Empreendedora, PAL, CAMI e Alinha para que pudessem desenvolver suas competências empreendedoras e fortalecer seus negócios. O relatório do projeto (2014-2019) se encontra em anexo deste artigo!

Uma cadeia com fortes desigualdades

Não é de hoje que a cadeia da moda e têxtil é apontada por suas práticas pouco inclusivas. O setor vestuário no Brasil ocupa o 4º lugar na produção mundial e representa quase 8% dos empregos formais. Contudo, observamos que existe nessa indústria muito trabalho informal que se torna até difícil de medir: as estimativas apontam entre 10 e 100 mil o número de trabalhadores imigrantes só na cidade de São Paulo. Além da informalidade, as condições de trabalho são muito precárias, e muitas vezes análogas à escravidão. Uma das principais causas desse cenário é a terceirização e quarteirização de micro e pequenas facções que não conseguem receber valores justos a partir das suas produções. Com tudo isso ainda, segundo a Abit – Associação Brasileira da Industria Têxtil apenas 20% do consumo das roupas no Brasil são feitas no grande varejo, mostrando que a maior parte são realizadas nos pequenos e médios estabelecimento, local para onde a maioria das facções prestam serviços.

Principalmente em São Paulo, observamos que a maioria dessas facções são gerenciadas por imigrantes Latino-americanos. Eles vieram para o Brasil em busca de melhores oportunidades e com o objetivo de juntar dinheiro para poder voltar para o seu país e oferecer um padrão de vida mais digno para si e suas famílias. Ao ingressar na cadeia da costura, eles acabam entrando em um ciclo vicioso que os mantêm muitas vezes na precariedade, impossibilitando até que voltem para seu país.

Por causa dessas dificuldades, o Tecendo Sonhos foi desenhado com o objetivo de empoderar e capacitar esses empreendedores e permitir que, além de melhorar suas condições de trabalho, possam gerar uma renda e um padrão de vida dignos.

Empoderamento pessoal: melhorias na gestão financeira

A inclusão financeira está no centro das preocupações do projeto. As capacitações permitem desenvolver uma melhor gestão, precificação das oficinas de costura e acesso a mercado justo. Assim, os seus donos conseguem aumentar os valores pagos por peça e garantir sua renda e a dos seus empregados.

“Depois do apoio do Tecendo Sonhos eu entendi melhor quanto custa o meu serviço e tive coragem de impor meu preço para um cliente antigo. Na hora ele falou que não aceitaria, que tinham outros que faziam, mas no dia seguinte me procurou e disse que aceitava meu preço pois tenho um bom acabamento”.
Nilton Vargas – Boliviano beneficiado do programa em 2019

O pulo do gato

Apesar dos avanços individuais dos empreendedores, algumas questões essenciais ficam travadas: é o caso da formalização. Ao se formalizar como ME ou migrar da MEI para ME, os custos fixos dos donos de oficina de costura aumentam entre 30% e 40%, por causa dos tributos vinculados à CLT e impostos do empreendimento. Adicionados à readequação do local e equipamentos do negócio, essa realidade se torna para muitos imigrantes do setor inviáveis.

E caso não tenham acesso a um mercado mais justo, para poder arcar esses custos, as oficinas precisam gerar mais receitas, reduzindo ainda sua carga de trabalho. Assim, o programa tem como objetivo também promover o acesso a mercado que pague valores justos por peças produzidas, ou ainda pensar em novos arranjos produtivos de forma mais coletiva, como a Rede com mais de 35 oficinas de costura que está sendo formada desde 2019.

Mobilizando o ecossistema

Nos últimos anos, o programa Tecendo Sonhos vem fortalecendo sua estratégia de advocacy para influenciar cada vez mais políticas públicas que visam a inclusão social e econômica dos imigrantes bem como regular as práticas comerciais do setor. Vários parceiros de todos os setores entraram nessa conversa: além das organizações sociais citadas no início do artigo, contamos com o apoio de organizações de classe como a ABVTEX (Associação Brasileira de Varejo Têxtil), a Abit (Associação Brasileira da Indústria Têxtil), Instituto InPACTO, empresas apoiadoras como o Instituto C&A, e Inditex/Zara, Mastercard Center For Inclusive Growth, OIT – Organização Internacional do Trabalho, organizações parceiras como a Firgun (crédito) e a Alinha (assessoria técnica e canal de venda), e também órgãos públicos como a FEAUSP, o Museu da Imigração do Estado de São Paulo e participação na COETRAE – Comissão Estadual para a Erradicação do Trabalho Escravo

Através dessas conexões e parcerias, o programa pretende minimizar as barreiras que impedem o desenvolvimento dos imigrantes em São Paulo e potencializar os crescimentos proporcionados pelas capacitações. Usando uma metáfora bem conhecida: não basta ensinar a pescar, é necessário garantir que a água seja calma e os peixes fartos.

 

Quer saber mais? Acesse o relatório do programa no anexo desse artigo!